28 de abril de 2009

Capítulo 25

Um menino genial

O ano de 71 se aproximava do fim. Chegou a Leme, na região de Ribeirão Preto, a big band Show Up, de São Paulo, integrada por Casé, Buda, Viché, Botinão, entre outros músicos da categoria peso-pesado. Os arranjos haviam sido comprados do norte-americano Sammy Nestico.

O trompetista Botinão era natural de Leme. Sua chegada à cidade foi motivo de festa para parentes e amigos. À tarde, no clube onde tocaria, a orquestra dava uma passada por alguns arranjos. Botinão chegou. Estava entusiasmado, recém-saído de uma feijoada com direito a muita caipirinha e cerveja. Aproximou-se do primeiro sax-alto e anunciou:

– Casé, é o seguinte: tem um moleque aqui que toca saxofone pra burro.

Testemunhar o surgimento de um grande saxofonista não era novidade para Casé. Ele já havia ouvido e incentivado em Santos, mais de uma década antes, um menino chamado Roberto Sion, que iria ocupara lugar de destaque entre os principais saxofonistas brasileiros.

Botinão mandou buscar o garoto numa chácara onde havia pés de goiaba, manga-rosa, banana e laranja-lima. Na casa de Geraldo Azevedo não havia televisão e usava-se uma carroça como meio de transporte. A música ajudava a cobrir a despesa. Geraldo tocava acordeom, órgão, clarineta e sax tenor. O menino, de nove anos, começara aos sete a estudar sax alto. Aos sábados tocava em festas com o pai e aos domingos integrava-se, na Praça São Manoel, à Corporação Musical Maestro Angelo Consentino.

Naylor – esse era o nome do pequeno saxofonista – chegou ao clube e foi apresentado a Casé. De calção e camiseta, no meio do salão, o menino tocou Czardas. Quando acabou, os músicos da orquestra fizeram uma pausa de espanto, igual à provocada décadas antes, na orquestra da Rádio Tupi, pelo garoto que agora devia ser alguém importante, conforme supôs Naylorzinho. “Puxa, como é que pode? Em Leme, um menino tocando assim...”, comentou Casé. “Você precisa ir pra São Paulo”, emendou Botinão.


Um ano depois o garoto começou a viajar para a Capital, num Ford Galaxie oferecido por Tripoli Donadel, o “Seu Pipe”, um fazendeiro apaixonado por música. E Naylor passou a ser atração de programas de televisão, um prodígio apresentado por Silvio Santos, Bolinha, Flávio Cavalcanti. Um dia foi convidado pela Tupi para participar do Clube dos Artistas. Seria uma responsabilidade maior. Ele seria acompanhado pela respeitável orquestra do maestro Luiz Arruda Paes. Recebeu em casa um arranjo de Czardas.

Anunciado por Airton e Lolita Rodrigues, entrou em cena e, enquanto se preparava para solar, olhou para trás. Enxergou, atrás das estantes, alguns grandes nomes do sopro – Bil no trombone, Jericó no trompete e, desta vez no sax-tenor, Casé, que havia escrito o arranjo. Novamente o menino tocou extraordinariamente bem.
- Agora mostra uma música daquele disco do Casé - pediu Botinão, após o programa, ao garoto cercado pelos veteranos. O menino tocou Se Acaso Você Chegasse, de Lupicínio Rodrigues e Felisberto Martins, primeira faixa do LP Samba Irresistível. Casé apoiou a mão no queixo:
- Fio da mãe, tá tocando igualzinho à gravação.
Parecia um músico nascido pronto, daí o apelido que passaria a carregar: Proveta, fundador, quase vinte anos depois, da Banda Mantiqueira.

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